De onde vem a sutil violência do falar

 
Se não conseguirmos manter um diálogo interno saudável, fatalmente, as palavras verbalizadas ou pensadas, poderão desaguar em doenças emocionais. E os mais prejudicados com o nosso comportamento agressivo, serão os mais próximos

“Perturbai-vos e não pequeis; falai com o vosso coração sobre a vossa cama e calai-vos. Oferecei sacrifícios de justiça e confiai no Senhor” (Salmo 4.4).

Quem nunca bateu aquele papo consigo mesmo ao ponto de esquecer que o mundo existe, que tinha alguém falando ou que tinha uma tela de cinema na sua frente?

Também chamado de diálogo interno, esse bate-papo é saudável se acontecer com moderação. Pois a própria autocrítica ajuda a nos desenvolvermos como pessoa. Agora quando esse diálogo vira julgamento e autocrítica, ferozes, é hora de parar e colocar essa voz no mudo. 

Ensina a psicóloga e advance Elaine Martins que, também é master trainer em PNL, que essa voz interna excessiva é um peso, rouba o nosso tempo e nos tira a concentração. 

Ela acrescenta que insônia e dificuldade de se relacionar com outras pessoas podem estar ligadas a um diálogo interno muito forte e muito presente, assim como a ansiedade. E orienta que quando nos pegarmos envoltos em mil pensamentos, que a gente filtre só o que for útil.

Fuja dos ataques

A facilitadora de comunicação não-violenta e mediadora de conflitos, Adriana Guerra, reforça que o pensamento influencia tudo e, que, podemos mudar a forma como enxergamos o mundo e as próprias emoções.

“A gente se relaciona com as pessoas a partir dos rótulos, dos julgamentos, da forma como fomos criados. E a gente traz nesse bojo uma linguagem muito violenta que induz sentimentos de medo, de culpa e de vergonha”, afirma. 

Segundo Adriana, estes sentimentos afastam de nós a compaixão e trazem violência no nosso modo de falar e nos nossos comportamentos. Mas, não necessariamente um comportamento ou fala, agressivos. 

Ela diz que é uma violência sutil que, num simples gesto, julga, condena, quer controlar, tirar o livre arbítrio do outro, quer dizer o que é bom e o que é ruim, o que se deve ou não fazer, sem qualquer preocupação com o que é importante para a outra pessoa.

“É uma violência que está tão impregnada na nossa vida que nem percebemos. Só que esses comportamentos acontecem de forma impulsiva”, diz.

Para a mediadora de conflitos, quando temos autoconhecimento e sabemos qual emoção está nos levando a ter determinado comportamento, fica mais fácil de contornar e controlar a situação.

“O segredo é encontrar uma estratégia onde a gente possa se escutar e perceber o que o comportamento de outra pessoa está gerando em nós”, orienta.

Praticando a autorregulação

O desafio é driblar o diálogo interno feroz que travamos na mente. De acordo com a facilitadora de treinamentos, professora e palestrante Luana Segato, em geral, somos mais violentos com nós mesmos do que com os outros

Ela diz que essa comunicação mental é tão estressora, ou seja, causa tanto estresse que, aos poucos, vai nos desequilibrando ao ponto de nem entendermos porque estamos com a energia baixa, mal humorados, irritados ou porque nada está bom. 

E muitas vezes não conseguimos entender o gatilho que gerou a emoção que nos levou a esse mal estar. E sem perceber, acaba por causar um dano para a saúde por não conseguirmos sair deste ciclo nocivo, além de tendermos a machucar, principalmente, as pessoas mais próximas - ou as que mais amamos -, observa Segato.

“A solução para isso é a autorregulação. É você ter o conhecimento desse diálogo mental inapropriado e conseguir desligar ele, colocar outro pensamento em cima disso e gerar questionamentos do porquê está se sentindo assim”, ensina Luana. 

Para Adriana Guerra, se a gente não parar e entender o que está acontecendo e conversar com essa voz interna, viveremos no automático machucando os outros sem nos dar conta.

“Irai-vos e não pequeis”

Todo esse conflito interno foi conhecido pelo próprio Deus quando se fez carne. Jesus já veio ao mundo com a missão de trazer a verdade do evangelho.

Fico imaginando como foi para Cristo experimentar os nossos complexos, o que se passa do lado de dentro do homem. Concluo que Ele deve ter se compadecido mais ainda de nós. 

Será por isso que Jesus declarou:

“O espírito é o que vivifica, a carne para nada aproveita; as palavras que eu vos disse são espírito e vida" (João 6.63)

Fica a reflexão.

Antes mesmo de vir ao mundo, o espírito de Cristo inspirou o salmista Davi a nos dizer: “Perturbai-vos e não pequeis; falai com o vosso coração sobre a vossa cama e calai-vos. Oferecei sacrifícios de justiça e confiai no Senhor” (Salmo 4.4).

Observe só a orientação que a Bíblia dá para um diálogo interno moderado: “falai com o vosso coração sobre a vossa cama e calai-vos”. 

Tudo a ver com o que as especialistas acima afirmaram sobre a nocividade dos pensamentos e a importância de se fazer questionamentos para compreender o que se passa do lado de dentro.

Se não conseguirmos manter esse diálogo interno saudável, fatalmente, as palavras verbalizadas ou pensadas, poderão desaguar em doenças emocionais.

Agora veja como o apóstolo Paulo foi ainda mais enfático em relação a uma das emoções que se alojam no nosso corpo e nos levam a comportamentos agressivos se não for controlada:

“Irai-vos e não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira. Não deis lugar ao diabo” (Efésios 4.26).

Compreendo com isso, que Jesus sabe que poderemos em algum momento ou outro ser tomados pelo impulso da emoção. Mas adverte para não nos deixarmos dominar porque, senão, daremos lugar ao inimigo das nossas almas.

O agravante é que, além de tudo isso, também ficamos com sequelas na alma: sem paz e sem equilíbrio. Sem contar que já foi comprovado cientificamente os malefícios do excesso de raiva no organismo provocando doenças e alterações na nossa fisiologia.

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